segunda-feira, 1 de junho de 2015

O MUNDO DA FOTÓGRAFA-BABÁ VIVIAN MAIER

Imaginem uma mulher que trabalha como babá cuidando de crianças e consegue realizar uma obra imensa de fotografias de alta qualidade. Sem nenhum alarde, sem divulgação. Só sabemos dela por causa da descoberta de seu material fotográfico por uma pessoa que também é especial. Conheça essa história intrigante. 

A DESCOBERTA 


Nada se sabia dela até que John Maloof procurando material iconográfico para um estudo sobre Chicago, sem saber o que continha, arrematou uma caixa com negativos por cerca de 400 dólares. Observando o material que tinha comprado percebeu o seu valor. Foi então atrás de mais fotos e descobriu também caixas com papéis e correspondência cujos endereços foram abrindo portas para a vida que havia atrás de tudo isso. 

Aos poucos, ele se apaixonou e tomou para si a tarefa de cuidar desse material. Depois de procurar inutilmente cooperação ao vivo para a divulgação, começou a publicar na internet. Como a repercussão foi grande, ele pôde iniciar daí em diante publicações em revistas e amostras Das fotos em exposições e galerias.


Para completar o trabalho de pesquisa ele foi em busca das pessoas que tinham convivido com Vivian Maier. Chegou às pessoas de quem ela tinha cuidado como babá, recuperou os caminhos por ela percorridos, tendo ido inclusive à França onde ela tinha estado para receber uma herança a que tinha direito, visto que sua mãe era francesa.

E aos poucos foi assim revelando o trajeto da vida de Vivian Maier. Em 2013, John Maloof realizou um documentário (A fotografia oculta de Vivian Maier/Finding Vivian Maier) em que relata detalhes dessa história pessoal e de suas possíveis ligações com a obra fotográfica desenvolvida, que abarca além de um número incrível de negativos (100.000 a 150.000, em centenas de rolos), também filmes caseiros, entrevistas de fita de áudio e vários outros itens. Ainda há muito a ser divulgado desse material imenso produzido principalmente entre os anos 1950 e 80.

O anonimato não interrompeu a capacidade expressiva de Vivian Maier. Ela construiu uma obra independente de reconhecimento. Como isso ocorreu?  

As fotos que ela realizou ganharam vida pelo movimento de John Maloof. E a cada passo dessa tarefa de revelação, poderemos conhecer um pouco mais de Vivian Maier ou, pelo menos, um pouco mais de seu mundo interno ou daquilo que a mobilizava.


O ENIGMA DE UMA VIDA DISCRETA

Vivian Maier nasceu em Nova York em fevereiro de 1926 de mãe francesa e pai austro-húngaro, que abandonou a família quando ela tinha quatro anos de idade. Passou parte da infância na França, mas voltou aos Estados Unidos onde morreu em 2009.

Trabalhou como babá por cerca de 40 anos, o que não a impediu de fazer fotos compulsivamente. Deixou registros das cidades de Nova York, Los Angeles e Chicago: ruas, arquitetura e população. Nos anos 1958 e 59, fez viagens pela América Central e do Sul e por Oriente Médio, Ásia e Europa. 

Nessa tarefa de fotografar, suas crianças às vezes eram levadas não poucas vezes a lugares estranhos. Detalhes como esse são descritos no documentário realizado por seu descobridor que não esconde alguns aspectos mais sombrios de sua natureza. A fotógrafa aparece em toda sua humanidade, com defeitos e manias. Por que motivo colecionar jornais, cheques sem terem sido descontados, ingressos, itinerário de viagens, chapéus, sapatos, tudo em caixas, inúmeras caixas e depois, no tempo da aposentadoria, guardá-las? Como justificar que ela tivesse sido grosseira em algumas situações em uma família com que trabalhou? Ela não é poupada. Esse estudo biográfico foi feito com a marca da veracidade e ao mesmo tempo com muito carinho. E ademais, tudo isso é irrelevante, perante sua obra.
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Não consta que ela tivesse tido treinamento formal para ser fotógrafa. Mesmo assim, os críticos encontram nela a qualidade similar aos trabalhos de Diane Arbus, Walker Evans e Robert Frank. Estudos críticos percebem uma evolução desde as primeiras fotos até um esmero técnico e sofisticação no enquadramento e na escolha da luz.

Mas, outras perguntas nos surgem: o que a conduziu a fotografar tanto? Para quê uma pessoa fotografa e guarda todos os rolos de negativos por anos a fio sem revelar? Como saber?

Ela não precisou de estímulo ou patrocínio. Conseguiu tudo sozinha e em silêncio. Uma vocação a impulsionava? Que mandato interno era esse? Que função teria tido a fotografia em sua vida?

No caso de Vivian Maier, a fotografia era uma parte escondida de sua vida tão ou mais necessária do que a externa. Talvez ela soubesse disso. O conjunto de seu trabalho é o legado físico da intensa paixão de Maier para documentar o que demandava sua atenção em movimento espontâneo na busca por pessoas e lugares. Era o seu mundo. Com o filtro da máquina, ela registrou o exterior. Mas assim acabava expressando também sua compreensão de tudo. A ótica da fotografia acaba sempre identificando seu autor. E John Maloof  percebeu valor nessas imagens.

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Foi o acaso que os aproximou. Mas a acuidade de sua observação produziu a abertura do mundo oculto da fotógrafa com um respeito profissional que fala muito de seu caráter. A vida dele mudou. Não há mais lugar para o trabalho de corretor de imóveis. Esse encontro foi bom para a memória de Vivian Maier e para ele também. São duas biografias que se transformaram. 

Quem foi Vivian Maier? Dela, só poderemos saber a partir da perspectiva de John Maloof, da luz que ele tem jogado sobre seu talento e vocação. No início, ele arriscou e ganhou.

Ganhamos todos nessa partilha. Nossa biografia poderá também ser tocada por cada uma das fotos desse mundo de mistério e de beleza. Do mundo de Vivian Maier. 

 Visite o site de Vivian Maier: http://www.vivianmaier.com/

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